quarta-feira, 19 de agosto de 2015

O perfume que as cores exalam

- Essa é amarela. - afirmou com convicção.
- Como você sabe? - perguntou a senhora curiosa.
- É cítrica e levemente suave. - respondeu com um sorriso.

- Hummm! Azul. - afirmou com um riso tímido.
- Como assim? - a senhora pergunta encabulada.
- É doce e suave. Um toque leve de liberdade. - riu.
- Liberdade não tem cheiro e nem cor. - Resmungou a senhora cujos olhos eram perfeitos.
- Não se preocupe, senhora. A liberdade só pode ser vista e sentida com a alma e o coração. - Sorriu procurando a direção da voz que veio com a pergunta incrédula.

- Vermelho! Vermelho!
- Não é possível!? - Assustada, aproximou-se da menina e fitou em seus olhos como se procurasse desvendar o segredo de tal visão.

- Esse é verde! - declarou com um sorriso lindo e logo ficou séria. - Preciso ir... Espero que volte mais vezes ao meu jardim.
- Você não me disse qual é o cheiro do vermelho e nem do verde, mocinha!
A menina riu.
- E se eu dissesse... Acreditaria? - Bradou desconfiada.
- Sim, querida. Acreditaria. Mal posso acreditar no que estou vendo!
- O vermelho é forte. Um arome agridoce, sua cor é quente. O verde é suave e possui um frescor delicioso em seu aroma.

Com sua bengala achou a trilha que a levaria pra casa e a senhora ficou ali parada, olhando a menina que nada via caminhando firmemente.

A senhora fechou os olhos e procurou descobrir as cores que estavam diante de si. Não acertou nenhuma.

A menina já distante, inspirou profundamente e bradou: "É azul!"
- Como pode, pobre menina cega saber a cor?
- As cores para mim tem cheiro! - Respondeu com sorriso e continuou a sua caminhada.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

A boca fala do que o coração está cheio

É preciso se esvaziar para não adoecer

Créditos: O Jardim de Lorenzo

Observar calada. Vi e vivi muita coisa. Guardei comigo um punhado de momentos que fizeram adoecer a minha carne e trouxeram dor aos meus ossos. Fingir não ver parecia ser uma boa opção para se livrar de aborrecimentos. Hipocrisia era uma casa nada acolhedora, porém por muito tempo foi o lugar que encontrei para me abrigar.

Sorrir quando o que mais desejava era chorar. Silenciar quando o que mais desejava era gritar. Surgir quando o que mais desejava era fugir...

A vida sempre nos oferece vários caminhos para se trilhar. As curvas não revelam o que vem depois. É preciso ter coragem para seguir enfrente e descobrir o que reservam as trilhas que escolhemos.

Bifurcações, cruzamentos, curvas,... Tantos são os caminhos... Tantas são as escolhas... Quantas consequências!

Nessa caminhada ou você morre sufocada com seu grito silencioso ou você desnuda a sua alma em cada passo que você dá; ou seus lábios se tornam túmulos caiados, onde o coração apodrece quando as decepções da jornada parecem ser invencíveis... Ou você abre a boca e mesmo que num sussurro lança fora tudo que te sufoca, te faz mal, te mata.

O que jorramos com a nossa boca nada mais é do que um turbilhão de situações que nos machucam e tentam nos matar aos poucos e são exteriorizados através de uma fala carregada, muitas vezes, com lágrimas e soluços.

Falar é a cura! Desabafar é o remédio.

Nosso coração não é depósito de lixo. Nossa boca não é um baú de palavras não ditas. Nossa vida não é insignificante.

Esvaziar é se dar uma chance de uma nova vida, de um novo amanhecer, de uma vida plena.

Esvaziar é se dar uma chance de ser livre!

Livre!

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

O chão que os pés não tocam

Ninguém é produto para carregar rótulos!


- "Incompreensível! Loucura! Só quer chamar à atenção! Não é deste mundo!"

Nunca se importou com o que os outros pensavam. Na realidade... Há tempos deixou de se importar. Percebeu que vivia presa na jaula do "o que vão pensar de mim" e que isso tinha se tornado um fardo insuportável de carregar.

Então, decidiu sonhar. Sonhar acordada. Brincar com seus pensamentos e rir alto mesmo se estivesse sozinha. Não ficaria mais preocupada se a rotulariam de louca ou coisa parecia. Ela sabia que a vida era muito curta pra se tornar uma embalagem vazia ou cheia de um conteúdo falsificado.

Se tinha vontade de dançar mesmo que a música fosse tocada somente em sua mente, ela dançaria aonde quer que estivesse e cantaria mesmo que a música fosse inventada.

Se a olhassem com aquele olhar de desprezo ou indignação e meneassem a cabeça como se estivesse fazendo algo muito errado, ela simplesmente sorria, piscava um dos olhos e continuava dançando e cantando.

Agora que havia descoberto a liberdade, nada e ninguém a aprisionariam novamente. Ela era livre!

Precisou pagar um preço alto por essa liberdade. Sentiu dor, teve perdas, foi abandonada e quase morreu. Mas foi bem aí que ela descobriu que a sua vida era como uma semente.

Uma árvore só nasce, cresce, floresce, frutifica se a semente morrer.

Sabia que a sua liberdade poderia libertar outros. E ela não hesitou...

Já não suportava ser uma pessoa diferente a cada ambiente que frequentava:

- Fale difícil que a admirarão! - dizia um.

- Cubra-se de roupas caras que a seguirão! - dizia outro.

- Não ande com gente simples e sem estilo! - dizia mais um.

- Jamais se esqueça da etiqueta ao sentar na mesa! - dizia mais um outro.

- Elegância é ter uma aparência caríssima, querida! - mais um aconselhava, ou seria imposição?

Nada disso fazia parte da sua alma...

Ela tinha um jeito simples de falar e fazia questão que todos que a cercavam a compreendessem. Sentia-se bem em usar roupas confortáveis para se movimentar como desejasse. Ela sabia que a maior riqueza estava em um lugar em que não se vê com os olhos e nem se toca com as mãos. Somente os pés a poderia levar lá.

Ela era só uma garota sonhadora que amava flores, poesia, música e esperava ser encontrada por seu príncipe. Mas não queria que ele viesse em um cavalo branco. Não! Nada disso. Ele viria caminhando pela neblina do alto da montanha em sua direção e a encontraria no jardim, recitando um livro de poesias e balançando seus pés no ar.

Uma alma livre e um coração puro era como se sentia feliz.

Ela percebeu que os conselhos que recebeu durante toda a sua vida vinham de pessoas vazias, sem vida no olhar, amantes de futilidades e status, apaixonadas por tudo o que é passageiro e cujo prazer é tão curto e mesquinho.

Ela queria mais...

Queria ser aquela lagarta que se liberta do casulo e descobre o mundo colorido e cheio de vida. Mundo de aromas, cores, versos e orvalho. Mundo de tempestades e também de sol. Mundo de estações e sensações. Mundo em que se descobre que é muito bom ser o que se é e se aceitar e se amar sendo quem é.

Simples assim...

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Meu texto escrito e publicado no Scribe